A China encerrou 2024 com aproximadamente 240 milhões de crianças entre 0 e 15 anos, segundo o Departamento Nacional de Estatísticas. Esse grupo representa 17,1% da população total e concentra um potencial de consumo em ascensão. A chamada “economia de pais e filhos”, centrada em bens e serviços para crianças e adolescentes, mas custeados pelos pais, deve ultrapassar 5 trilhões de yuans (US$ 685 bilhões) até 2025, impulsionada por transformações no comportamento familiar e pela digitalização precoce dos nascidos entre 2010 e 2025, a Geração Alfa.
Essa nova geração cresce imersa em ecossistemas digitais alimentados por algoritmos, vídeos curtos e plataformas de e-commerce interativo. A relação direta com as telas e a exposição constante a estímulos personalizados fazem com que os hábitos de consumo dos jovens chineses se tornem parte central das estratégias do varejo digital no país.
Digitalização precoce e consumo mediado pelos pais
A média diária de exposição às telas entre as crianças chinesas é de 4 horas e 44 minutos, de acordo com a plataforma EcommerceToChina. Esse tempo é distribuído entre aplicativos educacionais, jogos online, redes sociais e vídeos curtos, consumidos em plataformas como Douyin (versão chinesa do TikTok), Bilibili e Xiaohongshu (RedNote).
Embora os menores de idade não realizem transações diretas, sua influência sobre as decisões de compra é expressiva. Estima-se que o consumo intermediado pelos pais, sob demanda dos filhos, esteja entre US$130 bilhões e US$670 bilhões por ano na China. Os setores mais impactados incluem educação digital, tecnologia, moda e entretenimento.
Tecnologias interativas e e-commerce gamificado
Plataformas de e-commerce e marcas chinesas respondem a esse fenômeno com campanhas voltadas aos filhos, mesmo que o público pagante sejam os pais. Esse movimento é parte de uma estratégia mais ampla do mercado interno chinês para fomentar o consumo doméstico por meio da digitalização da infância e da adaptação dos negócios ao comportamento da Geração Alfa.
Um dos segmentos mais dinâmicos dessa economia é o de produtos educacionais digitais. De acordo com levantamento da Checkout.com, 59% dos pais chineses relatam pagar mensalmente por conteúdos e serviços educacionais online para seus filhos. A oferta inclui tutoria virtual, aplicativos com atividades gamificadas e cursos extracurriculares distribuídos em plataformas integradas ao ecossistema WeChat ou em apps dedicados como DingTalk.
Viagens familiares sob influência das crianças
O comportamento da Geração Alfa também tem impacto direto no turismo doméstico. Segundo relatório da rede Hilton Hotels, 98% das crianças chinesas da Geração Alfa e Geração Z participam ativamente das decisões relacionadas às viagens em família, e 68% dos pais escolhem destinos com base nas preferências dos filhos.
A popularização da hashtag #FamilyTravel nas redes sociais chinesas em 2024 evidenciou essa tendência. Resorts temáticos, hotéis com estrutura infantil e pacotes personalizados cresceram em popularidade. Parques como Shanghai Disneyland e Universal Beijing Resort registraram recordes de visitação durante feriados escolares, o que demonstra como o lazer infantil passou a operar como motor de decisão e consumo para o setor hoteleiro e de entretenimento.
Empresas do setor têm investido em infraestrutura voltada a esse público. Alguns hotéis incorporaram salas de jogos digitais, experiências imersivas com realidade aumentada e cardápios interativos em seus serviços, refletindo a expectativa de um cliente que, mesmo sem autonomia financeira, define prioridades de consumo com base em suas experiências digitais.
Implicações econômicas, sociais e tecnológicas
A expansão do consumo digital na infância levanta questões sobre os limites entre autonomia, influência e exposição. A capacidade das crianças de influenciar decisões de compra, pressiona setores como educação, tecnologia e turismo a responderem de forma rápida a demandas altamente voláteis, impulsionadas por tendências online, interatividade e algoritmos de recomendação.
O fenômeno, ainda em consolidação, abre espaço para debates sobre sustentabilidade do modelo, impactos no desenvolvimento infantil e estratégias de regulação compatíveis com um ambiente de consumo que começa cada vez mais cedo.
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