A decisão do governo dos Estados Unidos de elevar tarifas sobre produtos importados de quase todos os principais parceiros comerciais, intensificada com a aplicação de uma tarifa de 125% sobre produtos chineses, provocou uma nova escalada na guerra comercial com a China. A medida veio após Pequim anunciar na quarta-feira (9) uma retaliação tarifária de 84% sobre todas as importações americanas, com vigência a partir de 10 de abril. Em resposta, os EUA anunciaram que, por 90 dias, limitarão a 10% as tarifas recíprocas aplicadas a outros parceiros comerciais, mantendo a China como alvo principal. Apesar da justificativa de proteção à economia interna, a estratégia amplia riscos de inflação, desaceleração do comércio internacional e enfraquecimento da posição global dos Estados Unidos
Tarifas se distanciam da realidade do setor produtivo atual
Tarifas de importação são tributos cobrados sobre produtos estrangeiros. Ao longo da história, os Estados Unidos usaram esse instrumento para proteger setores estratégicos ou negociar concessões. Porém, o contexto atual é diferente. A economia americana é hoje baseada em serviços, inovação tecnológica e defesa, não mais na indústria de base e de mão de obra intensiva. Aplicar barreiras comerciais para tentar recuperar setores como o têxtil ou o de bens de consumo ignora os custos de produção internos e a complexidade das cadeias globais de suprimentos.
Medida sem aval do Congresso amplia críticas
Trump implementou as tarifas por meio de ação executiva, sem consulta ao Congresso nem diálogo com setores afetados. A decisão gerou críticas de lideranças do próprio Partido Republicano, de empresários e de governadores, especialmente nos estados agrícolas e industriais. Senadores alertaram para o risco de prejuízos econômicos, enquanto protestos em Michigan, Ohio e Wisconsin expuseram o temor de retaliações que atinjam agricultores e fabricantes locais.
Embora o discurso político aponte para um ônus imposto aos países estrangeiros, quem arca com os custos das tarifas são os importadores, varejistas e consumidores nos Estados Unidos. Produtos como smartphones sul-coreanos e maquinário alemão chegam ao mercado com preços mais altos. Segundo o Escritório de Orçamento do Congresso, o impacto médio para as famílias americanas pode chegar a US$1.300 por ano. Pequenas empresas, com menos margem de manobra para absorver custos ou redesenhar cadeias de fornecimento, sentem ainda mais os efeitos da política tarifária.
Aliados reagem com críticas e ameaças de retaliação
A União Europeia classificou as tarifas como injustificadas e prejudiciais. O Canadá afirmou que o antigo modelo de cooperação econômica com Washington está encerrado. A China declarou que os EUA violam normas internacionais e utilizam tarifas como ferramenta de coerção. Austrália, Coreia do Sul e Japão também expressaram desconforto, levantando a possibilidade de revisão de acordos comerciais e estratégicos.
Com a escalada das tarifas, parceiros comerciais dos EUA já anunciaram contramedidas. A China impôs restrições sobre produtos como soja, automóveis e bebidas alcoólicas. A Organização Mundial do Comércio registrou recorde de disputas em 2025. O Banco Mundial estima que tarifas generalizadas de 10% podem reduzir em 0,3 ponto percentual o crescimento global, que já é modesto, estimado em 2,7%. A economia americana, ainda sob efeitos da inflação e de choques logísticos, também corre risco de desaceleração.
Política tarifária ameaça alianças e reduz influência global dos EUA
Além do impacto econômico, a política comercial americana compromete alianças tradicionais construídas ao longo de décadas. Alemanha, Japão e Coreia do Sul questionam a previsibilidade da relação com os EUA. Enquanto isso, blocos como BRICS, OCS e RCEP expandem sua influência e integram mercados com rotas comerciais e sistemas próprios de pagamento, sem a presença americana. O protecionismo pode acelerar o isolamento dos EUA e enfraquecer sua posição em fóruns multilaterais.
A intenção de defender interesses nacionais é legítima, mas a estratégia tarifária mostra resultados opostos. A política gerou tensão interna, prejudicou alianças e agravou desequilíbrios econômicos. Em vez de insistir no isolacionismo, os Estados Unidos podem optar por mecanismos de comércio justo e negociação multilateral. Em um cenário global interdependente, a influência internacional depende de cooperação, não de confronto.
Fonte: Diário do Povo