Em junho, um avatar (personagem criado com inteligência artificial) vendeu o equivalente a US$7,6 milhões em sete horas de live na plataforma Youxuan, da Baidu. Era a versão digital do influenciador Luo Yonghao que, dessa vez, sequer apareceu. O resultado superou suas transmissões presenciais anteriores e marcou um ponto de virada: o entretenimento de vendas ao vivo na China está sendo automatizado, em escala.
A substituição de pessoas por avatares no live commerce chinês já não é um teste. Segundo In Hsieh, cofundador do Asia Latam Tech Forum e especialista em negócios digitais entre Brasil e China, mais de 100 mil clones digitais atuam hoje nesse tipo de transmissão, dentro de um mercado que movimenta US$946 bilhões por ano. O fenômeno indica uma nova fase no varejo digital do país, onde a presença humana começa a deixar de ser um fator primordial.
Live commerce virou mecanismo central do varejo chinês
O modelo de transmissões comerciais surgiu na China em 2016, quando o Alibaba integrou lives à plataforma Taobao para criar um canal direto entre vendedores e consumidores. A proposta inicial era demonstrar produtos ao vivo, tirar dúvidas em tempo real e gerar compras por impulso.
Nove anos depois, plataformas como Douyin, Kuaishou e Pinduoduo transformaram o recurso em parte do cotidiano da população chinesa. Só as transmissões da Douyin (versão chinesa do TikTok) movimentaram RMB 659 bilhões em 2024, segundo a consultoria chinesa Daxue. A audiência responde a estímulos visuais rápidos, linguagem direta e promoções relâmpago. E agora, também a personagens criados por IA.
Avatares assumem o protagonismo das vendas
Impulsionadas por inteligência artificial generativa, as marcas chinesas passaram a criar vendedores digitais para manter suas campanhas no ar 24 horas por dia. Esses avatares simulam voz, expressões faciais e gestos, com comportamento padronizado, tom constante e aparência amigável.
Diferente dos humanos, os clones digitais podem atuar em várias salas ao mesmo tempo e são programados para adaptar o discurso ao perfil do público e manter o ritmo da live sem oscilações. É uma solução escalável, especialmente em campanhas massivas ou em nichos técnicos, como vendas de eletrônicos, moda e cosméticos.
Além do caso de Luo Yonghao, há outros exemplos que sustentam a mudança. A Tencent lançou, em 2023, a personagem Xingtong (星瞳), considerada a primeira influenciadora virtual da moda chinesa. Em suas duas primeiras lives, ela superou RMB 1 em volume bruto de mercadorias (GMV) em cada uma. No segundo evento, vendeu mais de 4 mil placas gráficas, sem intervalo.
Em menos de dois anos, os clones deixaram de ser curiosidades tecnológicas para se tornarem ativos operacionais. Plataformas agora testam formatos híbridos, nos quais clones digitais complementam criadores humanos. Os avatares se tornam extensões das marcas, operando com consistência visual, tom padronizado e presença constante. O resultado é um novo perfil de vendedor: mais próximo de um streamer ou personagem de mídia do que de um representante comercial.
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